Dia Quente

Seus olhos contavam-me alguns segredos, embora seus lábios estivessem resistentes à fala por preferirem outro tipo de comunicação. Sim, eu havia entrado na livraria dele, pequena e cheia de livros antigos e, sim, eu havia olhado fixamente para seu rosto e a reciprocidade foi tão imediata que a excitação emergiu para aquecer ainda mais aquele dia fumegante. Ele atendia um jovem quando me aproximei da prateleira frontal, desviei meus olhos para as capas e os títulos, um deles me chamou atenção, segurei-o e folheei, perdi-me em seu interior poético até sentir-me sutilmente fria, algo incomum para aquele verão escaldante.

Olhei ao redor, ele não estava mais no balcão. A porta de sua livraria estava trancada, eu sabia, mas tentei por duas vezes abri-la até que senti o calor de seu corpo rente às minhas costas. Tremi.

— Os livros precisam de uma temperatura fria, mas amena, adequada para que se preservem sem se umedecerem — explicou. Senti suas mãos tocarem meus cabelos e àquela altura havia um doce rio mélico escorrendo dentro de mim. — Vamos para um lugar mais quente? — ele questiona e segura, com uma delicadeza inimaginável, a minha mão esquerda. Apesar da delicadeza, sua mão era firme, grande e um tanto áspera, tal como aprecio.

Andamos juntos para os fundos da livraria e adentramos um cômodo, semelhante a um estoque de produtos, nele habitava uma escada. Subimos. O andar de cima era uma casa, pequena como a livraria, no entanto aconchegante. Havia uma cama de casal próxima à janela a qual mostrava a rua agitada, o comércio a todo vapor. Era meio-dia. Um raio de sol incidia bem no centro da cama e as cores de terra e madeira evidenciavam-se para um ambiente em abundantes tons de terracota com nuances esverdeadas pelas plantas que residiam em alguns recantos.

Era a casa de um homem, mas não qualquer um; tratava-se de um homem cujo desejo se manifesta no fogo e se alastra no suor vívido da paixão. Ele foi à cozinha quando chegamos, era um único ambiente; pôs-me em direção à cama, para eu me sentar. Pegou na geladeira um copo d’água e bebeu, devagar. Olhava-me atento, talvez túrgido, eu imaginava. Não havia medo nele, não havia receio e, por isso, me senti profundamente confortável quando seu corpo se aproximou do meu e suas mãos tocaram meus ombros para descer as alças de meu vestido. O sol agora incidia em nós e estava cálido.

Podíamos ser vistos ali, por qualquer curioso dos prédios ao redor; mas aquele lugar era quase estritamente de comércio e, no comércio ninguém para. Nós paramos, quero dizer, alguém parou e que delícia parar naquele tempo, com aquele calor. Fui despida e beijada com a calma de quem tem todo o tempo do mundo e a face daquele homem inspirava anti-heroísmo. Sua pele era negra-dourada, ainda mais sob a luz do astro-rei e o seu beijo que encontrou meus lábios úmidos era escaldante e imersivo. Os olhos verdes — quais reparei só depois quando sua mão esquerda segurou meu pescoço enquanto respirava a avidez de seus dedos da mão direita em um movimento circular em meu clitóris intumescido… os olhos verdes… abri meus lábios e gemi como nunca outrora o fiz com nenhum outro homem e, há um ponto de meu orgasmo, ele parou para mais um beijo suado.

Estávamos suados, não só pelo calor do dia, o desejo aquece. Tirei-lhe a camisa e toda a sua roupa obscura como a noite, seu corpo era sublime, não pela forma, mas por pertencer a ele. Contemplei-o e ao focar seu falo intumescido, fui roubada para mais um beijo e levada em seus braços para cima de seu corpo. Encaixada delicadamente sobre a fonte da energia daquele anti-herói — que eu diria ser um deus ou um anjo caído eternamente pertencente à luz e ao fogo — senti-o profundamente. O encaixe perfeito… e a penetração ardente… fechei meus olhos, mas ele não me permitiu parar de olhá-lo. Seus olhos… entreabri meus lábios e ouvi o silêncio absurdo ao redor de um único som.

— Radamés… — ele sussurra e toca o mais profundo dentro de mim… sinto muito por não poder continuar fitando seus olhos, o êxtase é tão grande… sinto sua mão segurar firme meus cabelos já molhados e a outra contornando minhas costas para o movimento contínuo que se seguia a partir dali… Radamés… Radamés… Só poderia ser o seu nome. Ele me deixa sobre a cama, devagar, sobre mim continua penetrando, tomando-me enquanto minha cona suga seu pênis como se almejando toda a sua energia triunfante. Quero me apresentar a ele, no entanto, não posso; estou sem controle de mim e o ritmo que aumenta eleva à mesma altura os meus gritos de lascívia. Estaria alguém nos ouvindo naquela rua movimentada? Radamés continua, pujante, e ouço seus sutis sons agressivos pelo prazer que lhe domina — o único que poderia dominá-lo. Beijamo-nos outra vez e ele se afasta de dentro de mim. Estamos suados, quentes, reluzimos sobre sua cama.

— Diz para mim… — ouço dele…

— Noemi… — apresento-me em sussurro e ele toma meu rosto, acaricia-me. Segura meu corpo e vira-me contra o seu.

— Assim… Noemi… como poderia me servir… se eu fosse mesmo um deus… — surpreendo-me com o que ouço e, por segundo, estagno… Radamés sorri. — Um deus… ou anjo caído… — ele profere e, claro, claro… meus pensamentos saíram em voz alta; não havia sido tão mero e inocente. Senti-me envergonhada, mas Radamés ainda sorria… — Não se envergonhe, gostei de ouvir… — afirma em sussurro e eu sinto seu membro plenitúrgido tocar-me a fenda enquanto seus braços me envolvem tocando-me os seios e apertando-me, carinhosamente, nos mamilos. Como servir a um deus… Como servir ao deus Radamés…

— Noemi… — ouço outra vez e como gosto de ouvir… Toco seu falo naquele instante e direciono-o para dentro de mim… ele me penetra com toda a força que o rege e a rapidez com que me consome é ainda mais impetuosa do que antes. Sobre ele, me movimento, quero mais e mais fundo, mais e mais forte, mais e mais rápido. Ele faz. Olho para a janela e observo as pessoas correrem contra o tempo enquanto não há mais tempo, nem espaço, para nós dois. Radamés me leva à janela num único movimento e eu me apoio sobre ela, estou de quatro, a minha posição preferida, pois Radamés segura minhas ancas e força-me mais forte contra seu membro… aperta-me, sufoca-me… e o dia é mais quente sobre nós, sobre o meu orgasmo florido súbito impedindo-me de sustar meu próprio corpo…, mas meu homem me segura, trêmula e completamente fraca. Põe-me deitada sobre sua cama e eu me afasto ao canto para ter minha cabeça abaixada o suficiente para saborear… dos lábios à garganta… no mais fundo que pode ir….

— Assim… — digo e abro minha boca. Radamés vem até mim.

— Você o deseja… — ele toca seu membro em meu rosto, está tão duro que parece irreal. Ele passa sua glande em meus lábios, toco-a com minha língua… que sabor! O meu e o dele, juntos.

— Por favor… — imploro sem perceber e Radamés novamente sorri encaixando seu membro em minha boca e recheando-a completamente. Eu quero mais… chupo com voracidade, daquela forma que só eu sei fazer; Radamés estremece e sei que gosta porque aumenta a velocidade do sexo oral sem sequer perceber. Fecha seus olhos, as janelas esverdeadas do paraíso perverso; segura minha cabeça e mete. Engasgo diversas vezes e é assim que gosto e não consigo controlar a insanidade sexual que controla toda a minha existência até que vejo Radamés inclinar-se e, claro, ele não resistiria em beijar minha vulva, meu clitóris cheio de mel.

Ah… sim… aqueles lábios… aquele beijo… aqueles dedos penetrando-me ao mesmo tempo… eu chupo… eu sinto… ele lambe e devora… está mais quente do que antes, e mais quente… mais quente… tomo todo o seu líquido níveo como um manjar e ele toma do meu, o segundo orgasmo, em sua boca apetitosa.

Eu não sei o que houve naquele dia, mas permanecemos num amor infindável que, a quem contei, fui desacreditada. Só paramos quando o sol se pôs, porque Radamés é assim, filho do sol, sua energia está na claridade mais vívida da natureza e nada se compara ao seu sorriso no fim, repleto de contemplação e sublimidade.

Sahra Melihssa

Poeta, Escritora e Sonurista, formada em Psicologia Fenomenológica-Existencial e autora dos livros “Sonetos Múrmuros” e “Sete Abismos”. Sahra Melihssa é a Anfitriã do projeto Castelo Drácula e sua literatura é intensa, obscura, sensual e lírica. De estilo clássico, vocábulo ornamental e lapidado, beleza literária lânguida e de essência núrida, a poeta dedica-se à escrita há mais de 20 anos. N’alcova de seu erotismo, explora o frenesi da dor e do prazer, do amor e da melancolia; envolvendo seus leitores em um imersivo, e por vezes sombrio, deleite. A sua arte é o seu pertencente recôndito e, nele, a autora se permite inebriar-se em sua própria, e única, literatura.

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Queira-me de joelhos